quarta-feira, 28 de outubro de 2009

domingo, 4 de outubro de 2009

Mercedes Sosa e Milton Nascimento

La Negra partiu - Saudades !

Voltar aos 17 depois de viver um século

É como decifrar sinais sem ser sábio competente

Voltar a ser de repente tão frágil como um segundo

Voltar a se sentir importante como 1 criança ante Deus

Isso é o q sinto eu neste instante fecundo

Vai se envolvendo, envolvendo

Como no muro a hera

E vai brotando, brotando

Como o musgo na pedra

Como o musgo na pedra, ai sim, sim, sim.

Meu passo retrocede quando o teu avança

A arca das alianças penetrou em meu ninho

Com todo seu colorido tem passeado por minhas veias

E até a dura cadeia com q nos prende o destino

Como um diamante fino q ilumina minha alma serena
Vai se envolvendo, envolvendo

Como no muro a hera

E vai brotando, brotando

Como o musgo na pedra

Como o musgo na pedra, ai sim, sim, sim

.O q pode o sentimento o saber não tem conseguido

Nem o mais claro proceder, nem o maior pensamento

Tudo o muda no momento qual mago condescendente

Nos afasta docemente de rancores e violências

Só o amor com sua ciência nos torna tão inocentes

Vai se envolvendo, envolvendo

Como no muro a hera

E vai brotando, brotando

Como o musgo na pedra

Como o musgo na pedra, ai sim, sim, sim.

O amor é um turbilhão de pureza original

Até o mais feroz animal sussurra seu doce som

Detém os peregrinos, liberta os prisioneiros

O amor com seus esforços ao velho o volta criança

E ao mau só o carinho o torna puro e sincero

Vai se envolvendo, envolvendo

Como no muro a hera

E vai brotando, brotando

Como o musgo na pedra

Como o musgo na pedra, ai sim, sim, sim.

De par em par a janela se abriu como pro encanto

Entrou o amor com seu manto como uma fraca manhã

Ao som de seu belo toque fez brotar o jasmim

Voando q nem serafim ao céu lhe pôs brincos

Meus anos em 17 os converteu em querubim

Mercedes Sosa - A América Latina chora !

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Chico Buarque - Imagina


Imagina
Imagina
Hoje à noite
A gente se perder
Imagina
Imagina
Hoje à noite
A lua se apagar
Quem já viu a lua cris
Quando a lua começa a murchar
Lua cris
É preciso gritar e correr, socorrer o luar
Meu amor
Abre a porta pra noite passar
E olha o sol
Da manhã
Olha a chuva
Olha a chuva, olha o sol, olha o dia a lançar
Serpentinas
Serpentinas pelo céu
Sete fitas
Coloridas
Sete vias
Sete vidas
Avenidas
Pra qualquer lugar
Imagina
Sabe que o menino que passar debaixo do arco-íris vira moça,
A menina que cruzar de volta o arco-íris rapidinho vira volta a ser rapaz
A menina que passou no arco era o Menino que passou no arco
E vai virar menina
Hoje à noite
A gente se perder
Imagina
Hoje à noite
A lua se apagar

terça-feira, 29 de setembro de 2009

domingo, 6 de setembro de 2009

quinta-feira, 30 de julho de 2009


Quem será que me chega
Na toca da noite
Vem nos braços de um sonho
Que eu não desvendei
Eu conheço o teu beijo
Mas não vejo o teu rosto
Quem será que eu amo
E ainda não encontrei
Que sorriso aberto
Ou olhar tão profundo
Que disfarçe será que usa
Pro resto do mundo
Onde será que voce mora
Em que lingua me chama
Em que cena da vida
Haverá de comigo cruzar
Que saudade é essa
Do amor que eu não tive
Porque é que te sinto se nunca te ví
Será que são lembranças de um tempo esquecido
Ou serão previsões
De te ver por aqui.Então vem
Me desvenda esse amor
Que me faz renascer
Faz do sonho algo lindo
Que me faça viver
Diz se fiz com os ceus algum trato
Esclarece esse fato
E me faz comprender
Esse beijo esse abraço na imaginação
E descobre o que eu guardo pra ti
No meu coração
Mas deixa eu sonhar,deixa eu te ver
Vem e me diz quem é voce
Mas deixa eu sonhar ,deixa eu te ver
Vem e me diz quem é voce.

sábado, 9 de maio de 2009

Nicanor - Chico Buarque




Onde andará Nicanor?
Tinha mãos de jardineiro
Quando tratava de amor
Há tanta moça na espera
Suas gentis primaveras
Um desperdício de flor
Onde andará Nicanor?
Tinha amor pro porto inteiro
Um peito de remador
Ah, quem me dera as morenas
Pra consolar suas penas
Para abrandar seu calor

Olha elas sempre aflitas
Bata o vento ou caia chuva
Cada uma mais bonita
E mais viúva
Todas elas fazem ninho
Da saudade e da virtude
Mas carinho
Queira Deus que Deus ajude

Onde andará Nicanor?
Tinha nó de marinheiro
Quando amarrava um amor
Mas há recantos guardados
Nos sete mares rasgados
Sete pecados tão bons

sábado, 25 de abril de 2009

A liberdade é o maior bem da humanidade





TANTO MAR

*Chico Buarque

Sei que estás em festa, pá
Fico contente
E enquanto estou ausente
Guarda um cravo pra mim

Eu queria estar na festa, pá
Com a tua gente
E colher pessoalmente
Uma flor do teu jardim

Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar
Sei também que é preciso, pá
Navegar, navegar

Lá faz primavera, pá
Cá estou doente
Manda urgentemente
Algum cheirinho de alecrim

quinta-feira, 26 de março de 2009

terça-feira, 17 de março de 2009

Um tributo a Flush - Em 17 de março de 2008 ele foi para o ceu dos cachorros!!!


"Ah, Flush", disse a Senhorita Barrett.


Pela primeira vez, ela o olhou nos olhos.


Pela primeira vez, Flush viu a dama deitada no sofá.


Os dois se surpreenderam.


Cachos pesados pendiam das laterais do rosto da Senhorita Barrett; grandes olhos espertos brilhavam; uma grande boca sorria.


Orelhas pesadas pendiam das laterais do rosto de Flush; seus olhos também eram grandes e inteligentes; sua boca estava aberta.


Havia algo de comum entre os dois.


Enquanto encaravam um ao outro, pensaram: aqui estou eu.


Então, sentiram: mas que diferente! O rosto dela era pálido, de uma inválida, afastado do ar, da luz, da liberdade. O dele era o rosto saudável e afetuoso de um animal jovem; cheio de saúde e de energia.


Separados violentamente, apesar de originados no mesmo molde, será que um completava o que estava latente no outro?


Ela realmente poderia ser tudo aquilo, mas ele... não.


Entre os dois existia o maior abismo que pode separar um ser do outro. Ela falava. Ele era mudo.


Ela era uma mulher; ele era um cão.


Assim, intimamente ligados; assim, imensamente separados, um encarava o outro.


Então, de um salto, Flush subiu no sofá e se acomodou no lugar em que permaneceria para todo o sempre — sobre a manta aos pés da Senhorita Barrett.

sábado, 21 de fevereiro de 2009

Bienal - Zeca Baleiro e Zé Ramalho

Bienal - Zeca Baleiro - Zé Ramalho


Desmaterializando a obra de arte do fim do milênio

Faço um quadro com moléculas de hidrogênio

Fios de pentelho de um velho armênio

Cuspe de mosca, pão dormido, asa de barata torta

Meu conceito parece, à primeira vista

Um barrococó figurativo neo-expressionista

Com pitadas de arte nouveau pós-surrealistacalcado da revalorização da natureza morta

Minha mãe certa vez disse-me um dia

Vendo minha obra exposta na galeria

"Meu filho, isso é mais estranho que o c da jia

E muito mais feio que um hipopótamo insone"

Pra entender um trabalho tão moderno

É preciso ler o segundo caderno

Calcular o produto bruto interno

Multiplicar pelo valor das contas de água, luz e telefone

Rodopiando na fúria do ciclone

Reinvento o céu e o inferno

Minha mãe não entendeu o subtexto

Da arte desmaterializada no presente contexto

Reciclando o lixo lá do cesto

Chego a um resultado estético bacana

Com a graça de Deus e Basquiat

Nova York, me espere que eu vou já

Picharei com dendê de vatapá

Uma psicodélica baiana

Misturarei anáguas de viúva

Com tampinhas de pepsi e fanta uva

Um penico com água da última chuva

Ampolas de injeção de penicilina

Desmaterializando a matéria

Com a arte pulsando na artéria

Boto fogo no gelo da Sibéria

Faço até cair neve em Teresina

Com o clarão do raio da silibrina

Desintegro o poder da bactéria

Com o clarão do raio da silibrina

Desintegro o poder da bactéria

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Clarice Lispector


"Deixo-me acontecer, fragmentária que sou e precários os momentos. Só me comprometo com a vida, que nasça com o tempo e com ele cresça. Só no tempo há espaço para mim".

“Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece, como eu mergulhei. Não se preocupe em entender. Viver ultrapassa qualquer entendimento”.

"Não pense que a pessoa tem tanta força assim a ponto de levar qualquer espécie de vida e continuar a mesma. Até cortar os defeitos pode ser perigoso - nunca se sabe qual o defeito que sustenta nosso edifício inteiro…


Há certos momentos em que o primeiro dever a realizar é em relação a si mesmo. Quase quatro anos me transformaram muito. Do momento em que me resignei, perdi toda a vivacidade e todo interesse pelas coisas.


Você já viu como um touro castrado se transforma em boi. Assim fiquei eu…Para me adaptar ao que era inadaptável, para vencer minhas repulsas e meus sonhos, tive que cortar meus grilhões - cortei em mim a forma que poderia fazer mal aos outros e a mim. E com isso cortei também a minha força.


Ouça: respeite mesmo o que é ruim em você - respeite sobretudo o que imagina que é ruim em você - não copie uma pessoa ideal, copie você mesma - é esse seu único meio de viver. Juro por Deus que, se houvesse um céu, uma pessoa que se sacrificou por covardia ia ser punida e iria para um inferno qualquer. Se é que uma vida morna não é ser punida por essa mesma mornidão.


Pegue para você o que lhe pertence, e o que lhe pertence é tudo o que sua vida exige. Parece uma vida amoral. Mas o que é verdadeiramente imoral é ter desistido de si mesma.


Gostaria mesmo que você me visse e assistisse minha vida sem eu saber. Ver o que pode suceder quando se pactua com a comodidade da alma”.


terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Ausência - Vinícius de Moraes



Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces


Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto


No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida


E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.


Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado.


Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados


Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada


Que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado.


Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face.


Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada.


Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite.


Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.


Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço.


E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.


Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.


Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir.


E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas.


Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

Chico Buarque lê Álvaro de Campos

"Budapeste"Filme baseado no livro de Chico Buarque estréia em abril nos cinemas.

quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

A vida tem Tons



Se tem tom, tem canção


Se tem canção, tem o tom


Se tem o Tom, tem Jobim


Se tem Jobim, tem Vinicius


Se tem Vinicius, tem a prosa


Se tem a prosa, tem os versos


Se tem os versos, tem a bossa


Se tem a bossa, tem o Chico


Se tem o Chico, tem Buarque


E se tem tudo isto, tem alegria


E se tem alegria, tem a vida


Porque a vida sem alegria


É como o Chico sem a bossa


É como a bossa sem os versos


É como os versos sem a prosa


É como a prosa sem Vinicius


É como Vinicius sem Jobim


É como Jobim sem canção


É como canção sem um tom


Porque quem dá o tom da canção da vida, é a alegria


*Pergentino Júnior


Publicado no Recanto das Letras em 31/05/2008

Ai que saudade d'ocê - ALCEU VALENÇA

domingo, 25 de janeiro de 2009

JOHN LENNON


A mulher é o negro do mundo.

A mulher é a escrava dos escravos.

Se ela tenta ser livre, tu dizes que ela não te ama.

Se ela pensa, tu dizes que ela quer ser homem.

25 DE JANEIRO - DIA DO CARTEIRO

Muito tem sido falado do carteiro como profissional, mensageiro de boas e más notícias. Entretanto, aquele que fielmente cumpre a sua missão, tornando-se o elo principal entre as pessoas, independentemente da distância, é, acima de tudo, um admirável ser humano.
Um brasileiro que, como todos os outros, tem alma e coração.
Alma para entender o espírito de seu semelhante e disponibilizar o ombro amigo no primeiro momento após o recebimento de uma informação desagradável.
Coração para perceber o brilho no olhar de quem recebe aquela tão esperada notícia de um ente querido.
Os Correios têm no carteiro o seu mais representativo símbolo de identidade junto à sociedade em geral.
É a imagem da Empresa que, juntamente com milhões de correspondências, chega diariamente aos diversos lares brasileiros.
O carteiro, essa figura simpática que, por estar todos os dias passando por nossas casas, é facilmente adotado, involuntariamente, pela família.
Quem de nós não já ouviu a expressão carinhosa "o meu carteiro" ou "o carteiro lá de casa"? Essa é a forma como tratamos o nosso carteiro.
O nosso amigo de todos os dias.
Aquele que, faça chuva ou faça sol, sempre passará pela nossa porta deixando uma mensagem de alguém que lembrou de nós.

sábado, 17 de janeiro de 2009

Eduardo Galeano - " Espelhos "


"Os espelhos estão cheios de gente

Os invisíveis nos vêem

Os esquecidos nos lembram

Quando nos vemos, os vemos

Quando nos vamos, eles se vão?"


"Este livro foi escrito para que não partam

Nestas páginas unem-se o passado e o presente

Renascem os mortos, os anônimos têm nome

os homens que ergueram os palácios e os templos de seus amos

as mulheres, ignoradas por aqueles que ignoram o que temem

o sul e o oriente do mundo, desprezados por aqueles que desprezam o que ignoram

os muitos mundos que o mundo contém e esconde

os pensadores e os que sentem

os curiosos, condenados por perguntar

e os rebeldes e os perdedores e os lindos loucos que foram e são o sal da terra."


*Em 'Espelhos - Eduardo Galeano analisa a história da humanidade sob a ótica dos desvalidos, dos esquecidos da história oficial.

Em tom de crônica poética, o livro traz um panorama de acontecimentos e de transformações do mundo, misturando o passado e o presente.


Recomendo!


terça-feira, 13 de janeiro de 2009

O teu riso


Tira-me o pão, se quiseres,


tira-me o ar, mas não


me tires o teu riso.


Não me tires a rosa,


a lança que desfolhas,


a água que de súbito


brota da tua alegria,


a repentina onda


de prata que em ti nasce.


A minha luta é dura e regresso


com os olhos cansados


às vezes por ver


que a terra não muda,


mas ao entrar teu riso


sobe ao céu a procurar-me


e abre-me todas


as portas da vida.


Meu amor, nos momentos


mais escuros soltao teu riso


e se de súbito


vires que o meu sangue mancha


as pedras da rua , ri , porque o teu riso


será para as minhas mãos


como uma espada fresca.


À beira do mar, no outono,


teu riso deve erguer


sua cascata de espuma,


e na primavera , amor,


quero teu riso como


a flor que esperava,


a flor azul, a rosa


da minha pátria sonora.


Ri-te da noite,do dia, da lua,


ri-te das ruas


tortas da ilha,


ri-te deste grosseiro


rapaz que te ama,


mas quando abro


os olhos e os fecho,


quando meus passos vão,


quando voltam meus passos,


nega-me o pão, o ar,a luz,


a primavera,mas nunca o teu riso,


porque então morreria.


*Pablo Neruda

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Vida de gado - Zé Ramalho

Vida de Gado - Zé Ramalho

Vocês que fazem parte dessa massa
Que passa nos projetos do futuro
É duro tanto ter que caminhar
E dar muito mais do que receber
E ter que demonstrar sua coragem
À margem do que possa parecer
E ver que toda essa engrenagem
Já sente a ferrugem lhe comer
Êh, oô, vida de gado
Povo marcado
Êh, povo feliz!
Lá fora faz um tempo confortável
A vigilância cuida do normal
Os automóveis ouvem a notícia
Os homens a publicam no jornal
E correm através da madrugada
A única velhice que chegou
Demoram-se na beira da estrada
E passam a contar o que sobrou!
Êh, oô, vida de gado
Povo marcado
Êh, povo feliz!
O povo foge da ignorância
Apesar de viver tão perto dela
E sonham com melhores tempos idos
Contemplam esta vida numa cela
Esperam nova possibilidade
De verem esse mundo se acabar
A arca de Noé, o dirigível,
Não voam, nem se pode flutuar
Êh, oô, vida de gado
Povo marcado
Êh, povo feliz!

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

Na ciranda da vida...


"Não deixe portas entreabertas

Escancare-as...ou bata-as de vez

Pelos vãos, brechas e fendas

Passam apenas semiventos

Meias verdades

E muita insensatez".


*Cecília Meireles

domingo, 4 de janeiro de 2009

Fernando de Noronha - Pernambuco


Aqui nesta praia onde


Não há nenhum vestígio de impureza


Aqui onde há somente


Ondas tombando ininterruptamente


Puro espaço e lúcida unidade


Aqui o tempo apaixonadamente


Encontra a própria liberdade.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

Vinicius de Moraes

O Haver


Resta, acima de tudo, essa capacidade de ternura

Essa intimidade perfeita com o silêncio

Resta essa voz íntima pedindo perdão por tudo

- Perdoai! eles não têm culpa de ter nascido...


Resta esse antigo respeito pela noite, esse falar baixo

Essa mão que tateia antes de ter, esse medo

De ferir tocando, essa forte mão de homem

Cheia de mansidão para com tudo que existe.


Resta essa imobilidade, essa economia de gestos

Essa inércia cada vez maior diante do Infinito

Essa gagueira infantil de quem quer balbuciar o inexprimível

Essa irredutível recusa à poesia não vivida.


Resta essa comunhão com os sons, esse sentimento

Da matéria em repouso, essa angústia da simultaneidade

Do tempo, essa lenta decomposição poética

Em busca de uma só vida, uma só morte, um só Vinicius.


Resta esse coração queimando como um círio

Numa catedral em ruínas, essa tristeza Diante do cotidiano; ou essa súbita alegria

Ao ouvir na madrugada passos que se perdem sem memória.


Resta essa vontade de chorar diante da beleza

Essa cólera cega em face da injustiça e do mal-entendido

Essa imensa piedade de si mesmo, essa imensa

Piedade de sua inútil poesia e de sua força inútil.


Resta esse sentimento da infância subitamente desentranhado

De pequenos absurdos, essa tola capacidade

De rir à toa, esse ridículo desejo de ser útil

E essa coragem de comprometer-se sem necessidade.


Resta essa distração, essa disponibilidade, essa vagueza

De quem sabe que tudo já foi como será e virá a ser

E ao mesmo tempo esse desejo de servir, essa

Contemporaneidade com o amanhã dos que não têm ontem nem hoje.


Resta essa faculdade incoercível de sonhar

De transfigurar a realidade, dentro dessa incapacidade

De aceitá-la tal como é, e essa visão

Ampla dos acontecimentos, e essa impressionante.


E desnecessária presciência, e essa memória anterior

De mundos inexistentes, e esse heroísmo

Estático, e essa pequenina luz indecifrável

A que às vezes os poetas dão o nome de esperança.


Resta essa obstinação em não fugir do labirinto

Na busca desesperada de uma porta quem sabe inexistente

E essa coragem indizível diante do grande medo

E ao mesmo tempo esse terrível medo de renascer dentro da treva.


Resta esse desejo de sentir-se igual a todos

De refletir-se em olhares sem curiosidade e sem história

Resta essa pobreza intrínseca, esse orgulho, essa vaidade

De não querer ser príncipe senão do seu reino.


Resta essa fidelidade à mulher e ao seu tormento

Esse abandono sem remissão à sua voragem insaciável

Resta esse eterno morrer na cruz de seus braços

E esse eterno ressuscitar para ser recrucificado.


Resta esse diálogo cotidiano com a morte, esse fascínio

Pelo momento a vir, quando, emocionada

Ela virá me abrir a porta como uma velha amante

Sem saber que é a minha mais nova namorada