sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

Um lindo presente !

Futuros amantes - Chico Buarque

Não se afobe, não
Que nada é pra já
O amor não tem pressa
Ele pode esperar em silêncio
Num fundo de armário
Na posta-restante
Milênios, milênios
No ar

E quem sabe, então
O Rio será
Alguma cidade submersa
Os escafandristas virão
Explorar sua casa
Seu quarto, suas coisas
Sua alma, desvãos

Sábios em vão
Tentarão decifrar
O eco de antigas palavras
Fragmentos de cartas, poemas
Mentiras, retratos
Vestígios de estranha civilização

Não se afobe, não
Que nada é pra já
Amores serão sempre amáveis
Futuros amantes, quiçá
Se amarão sem saber
Com o amor que eu um dia
Deixei pra você

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

A PROPÓSITO DISTO - Mayakovsky - A FÉ


Distendei vossa espera o quanto quiserdes

- tão clara, duma clareza tão alucinante

é minha visão que, dir-se-ia,

bastava o tempo de liquidar esta rima,

para, garimpando ao longo do verso,

entrar numa vida maravilhosa.

Eu não preciso indagar o que e como.

Vejo-o, nítido, até os último detalhes,

no ar, camada sobre camada,

como pedra sobre pedra.

Vejo erguer-se, fulgurando

no pináculo dos séculos,

isento de podridões ou poeiras,

o laboratório das ressurreições humanas.

Eis o calmo químico,

a vasta fronte franzida em meio à experiência

Num livro,

"Toda a Terra", procura ele um nome.

"O Século Vinte...vejamos, a quem ressuscitar?

A Maiakovsky talvez...

Não, busquemos matéria mais interessante!

Não era bastante belo esse poeta".

Será então minha vez de gritar daqui mesmo,

desta página de hoje:

"Pára, não folheies mais!

É a mim que deves ressuscitar!"

A ESPERANÇA - Mayakovsky


Injeta sangue no meu coração,

enche-me até o bordo das veias!

Mete-me no crânio pensamentos!

Não vivi até o fim o meu bocado terrestre ,

sobre a terra não vivi o meu bocado de amor.

Eu era gigante de porte, mas para que este tamanho?

Para tal trabalho basta uma polegada.

Com um toco de pena, eu rabiscava papel,

num canto do quarto, encolhido,

como um par de óculos dobrado dentro do estojo.

Mas tudo que quiserdes eu farei de graça:

esfregar, lavar, escovar, flanar, montar guarda.

Posso, se vos agradar, servir-vos de porteiro.

Há, entre vós, bastante porteiros?

Eu era um tipo alegre,

mas que fazer da alegria,

quando a dor é um rio sem vau?

Em nossos dias, se os dentes

vos mostrarem não é senão

para vos morder ou dilacerar.

O que quer que aconteça,

nas aflições, pesar...

Chamai-me!

Um sujeito engraçado pode ser útil.

Eu vos proporei charadas,

hipérboles e alegorias,

malabares dar-vos-ei em versos.

Eu amei...

mas é melhor não mexer nisso.

Te sentes mal?

Tanto pior...

Gosta-se, afinal, da própria dor.

Vejamos...

Amo também os bichos

- vós os criais, em vossos parques?

Pois, tomai-me para guarda dos bichos.

Gosto deles.

Basta-me ver um desses cães vadios,

como aquele de junto à padaria,

um verdadeiro vira-lata!

e no entanto, por ele,

arrancaria meu próprio fígado:

e toma, querido, sem cerimônia, come!

AMOR - Mayakovsky


*Um dia, quem sabe

ela, que também gostava de bichos

apareça numa alameda do zoo

sorridente, tal como agora está

no retrato sobre a mesa

Ela é tão bela, que, por certo

hão de ressuscitá-la

Vosso Trigésimo Século ultrapassará

o exame de mil nadas

que dilaceravam o coração

Então, de todo amor não terminado

seremos pagos em enumeráveis noites de estrelas

Ressuscita-me

nem que seja só porque te esperava

como um poeta,repelindo o absurdo quotidiano

Ressuscita-me, nem que seja só por isso

Ressuscita-me!

Quero viver até o fim o que me cabe!

Para que o amor não seja

mais escravo de casamentos

concupiscência, salários.

Para que, maldizendo os leitos

saltando dos coxins

o amor se vá pelo universo inteiro

Para que o dia, que o sofrimento degrada

não vos seja chorado, mendigado

E que, ao primeiro apelo

- Camaradas!

Atenta se volte a terra inteira

Para viver livre dos nichos das casa

Para que doravante a família

seja o pai

pelo menos o Universo

a mãe

pelo menos a Terra!

domingo, 14 de dezembro de 2008

Friedrich Nietzsche


"Há sempre alguma loucura no amor.

Mas há sempre um pouco de razão na loucura."

DUQUE...MEU ROT ...QUERIDO


Eu me lembro da primeira vez em que te vi.

Você estava com medo do mundo, o mundo era muito grande e frio.

Eu te estendi minha mão e você a beijou.

Eu te pedi para vir comigo e ver o mundo.

E só porque eu te pedi, você veio.

Eu me lembro daquele dia.

VOCÊ ME ENSINOU A ACREDITAR.


Eu lembro de você como um filhote, rodeado de brinquedos, colocados lá somente para você.

Eu ria enquanto você balançava tua cabeça e latia para mim, me convidando a brincar.

Você pegava meu sapato e fugia, só para eu te perseguir até você me devolver.

Eu me lembro daquele dia.

VOCÊ ME ENSINOU A BRINCAR.


Eu lembro de você como um cão, grande e forte.

Eu via você me saudar do com teu rabo abanando, e olhos atenciosos.

Eu sorria e me sentia segura.

Eu sabia que você sempre ficaria ao meu lado.

Eu me lembro daquele dia.

VOCÊ ME ENSINOU O QUE É FIDELIDADE.


Eu me lembro de você , rodeado pelos outros amigos seus.

Eu ria enquanto você faria caretas, quando um de teus amigos te mordia e tentava fazer-te brincar.

Eu vi você com esforço , correndo para lá e para cá.

Eu me lembro daquele dia.

VOCÊ ME ENSINOU A TER PACIÊNCIA.


Eu lembro de você tempos depois, cansado e desgastado.

Eu gostaria de te pegar, te abraçar e chorar.

Você me olhava com aqueles olhos marrom claros.

E quando a tua alma falou com a minha, você deixou este mundo grande e frio.

Então, eu murmurei "Adeus".

E mesmo neste momento , quando meus olhos queimavam em lágrimas, você me ensinou uma outra lição.

Eu sempre lembrarei daquele dia.

VOCÊ ME ENSINOU A AMAR.


Eu me lembro , daquele dia , daquele dia tão triste
Debaixo daquela quaresmeira
Que agente gostava tanto de ficar
Para fugir do calor !
É lá que até hoje , voce está morando
Debaixo de um canteiro de "amor perfeito"

Que eu plantei para você ,
Então voce me ensinou uma última lição
VOCE ME ENSINOU A SENTIR SAUDADES!

Florbella Espanca


CONTO DE FADAS


Eu trago-te nas mãos o esquecimento

Das horas más que tens vivido, Amor!

E para as tuas chagas o ungüento

Com que sarei a minha própria dor.


Os meus gestos são ondas de Sorrento...

Trago no nome as letras de uma flor...

Foi dos meus olhos garços que um pintor

Tirou a luz para pintar o vento...


Dou-te o que tenho: o astro que dormita,

O manto dos crepúsculos da tarde,

O sol que é d'oiro, a onda que palpita.


Dou-te comigo o mundo que Deus fez!

- Eu sou Aquela de quem tens saudade,

A Princesa do conto: “Era uma vez...

sábado, 13 de dezembro de 2008

William Shakespeare


De almas sinceras a união sincera

Nada há que impeça: amor não é amor

Se quando encontra obstáculos se altera

Ou se vacila ao mínimo temor.

Amor é um marco eterno, dominante

Que encara a tempestade com bravura

É astro que norteia a vela errante

Cujo valor se ignora, lá na altura.

Amor não teme o tempo, muito embora

Seu alfange não poupe a mocidade

Amor não se transforma de hora em hora

Antes se afirma para a eternidade.

Se isso é falso, e que é falso alguém provou

Eu não sou poeta, e ninguém nunca amou.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

Carlos Drummond de Andrade


AMOR ANTIGO


"O amor antigo vive de si mesmo

não de cultivo alheio ou de presença.

Nada exige nem pede.

Nada espera,mas do destino

não nega a sentença.

O amor antigo tem raízes fundas,

feitas de sofrimento e beleza


Por aquelas mergulhas no infinito,

e por estas suplanta a natureza

Se em toda parte o tempo desmorona

aquilo que foi grande e deslumbrante,

o antigo amor, porém, nunca fenece

e a cada dia surge mais amante.


Mais ardente, mas pobre de esperança.

Mais triste?

Não.

Ele venceu a dor,e resplandece

no seu canto obscuro,

tanto mais velho quanto mais amor

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Chico Buarque


Nicanor

Onde andará Nicanor?

Tinha mãos de jardineiro

Quando tratava de amor

Há tanta moça na espera

Suas gentis primaveras

Um desperdício de flor


Onde andará Nicanor?

Tinha amor pro porto inteiro

Um peito de remador

Ah, quem me dera as morenas

Pra consolar suas penas

Para abrandar seu calor


Olha elas sempre aflitas

Bata o vento ou caia chuva

Cada uma mais bonita

E mais viúva

Todas elas fazem ninho

Da saudade e da virtude

Mas carinho

Queira Deus que Deus ajude


Onde andará Nicanor?

Tinha nó de marinheiro

Quando amarrava um amor

Mas há recantos guardados

Nos sete mares rasgados

Sete pecados tão bons

Onde andará Nicanor?

Clarice Lispector


"Eu te conheço até o osso por intermédio

de uma encantação que vem de mim para ti.

Só há uma coisa que me separa de você:

o ar entre nós dois.


Às vezes para ultrapassar esse quase cruel afastamento,

eu respiro na tua boca que então me respira

e eu te respiro.


Mas só por um único instante, senão sufocaríamo-nos:

seria o castigo que se recebe quando um tenta ser o outro"


quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Clarice Lispector


Não entendo.

Isso é tão vasto que ultrapassa qualquer entender.

Entender é sempre limitado.

Mas não entender pode não ter fronteiras.

Sinto que sou muito mais completa quando não entendo.

Não entender, do modo como falo, é um dom.

Não entender, mas não como um simples de espírito.

O bom é ser inteligente e não entender.

É uma benção estranha, como ter loucura sem ser doida.

É um desinteresse manso, é uma doçura de burrice.

Só que de vez em quando vem a inquietação:

quero entender um pouco.

Não demais: mas pelo menos entender que não entendo.

Patativa do Assaré


"Eu sou de uma terra que o povo padece

Mas não esmorece e procura vencer.

Da terra querida, que a linda cabocla

De riso na boca zomba no sofrer

Não nego meu sangue, não nego meu nome

Olho para a fome , pergunto o que há ?

Eu sou brasileiro, filho do Nordeste,

Sou cabra da Peste, sou do Ceará."

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Chales Chaplin


Sorri quando a dor te torturar

E a saudade atormentar

Os teus dias tristonhos vazios


Sorri quando tudo terminar

Quando nada mais restar

Do teu sonho encantador


Sorri quando o sol perder a luz

E sentires uma cruz

Nos teus ombros cansados doridos


Sorri vai mentindo a tua dor

E ao notar que tu sorris

Todo mundo irá supor

Que és feliz!


Vinicius de Morais


Ai, quem me dera terminasse a espera

Retornasse o canto simples e sem fim

E ouvindo o canto se chorasse tanto

Que do mundo o pranto se estancasse enfim

Ai, quem me dera ver morrer a fera

Ver nascer o anjo, ver brotar a flor.

Ai, quem me dera uma manhã feliz.

Ai, quem me dera uma estação de amor

Ah, se as pessoas se tornassem boas

E cantassem loas e tivessem paz

E pelas ruas se abraçassem nuas

E duas a duas fossem ser casais

Ai, quem me dera ao som de madrigais

Ver todo mundo para sempre afim

E a liberdade nunca ser demais

E não haver mais solidão ruim

Ai, quem me dera ouvir o nunca-mais

Dizer que a vida vai ser sempre assim

E, finda a espera, ouvir na primavera

Alguém chamar por mim.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

A noite na ilha



Dormi contigo a noite inteira junto do mar, na ilha

Selvagem e doce eras entre o prazer e o sono, entre o fogo e a água

Talvez bem tarde nossos sonos se uniram na altura e no fundo

Em cima como ramos que um mesmo vento move

Embaixo como raízes vermelhas que se tocam

Talvez teu sono se separou do meu e pelo mar escuro

Me procurava como antes, quando nem existias

Quando sem te enxergar naveguei a teu lado

E teus olhos buscavam o que agora

- pão, vinho, amor e cólera

- te dou, cheias as mãos, porque

Tu és a taça que só esperava

Os dons da minha vida

Dormi junto contigo a noite inteira

Enquanto a escura terra gira com vivos

E com mortos, de repente desperto

E no meio da sombra meu braço rodeava tua cintura

Nem a noite nem o sonho puderam separar-nos

Dormi contigo, amor, despertei

E tua boca saída de teu sono me deu o sabor da terra

De água-marinha, de algas, de tua íntima vida

E recebi teu beijo molhado pela aurora

Como se me chegasse do mar que nos rodeia


*Pablo Neruda

domingo, 7 de dezembro de 2008

Borboletas - Victor e Léo



Meu melhor presente de Natal

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

Cancioneiro - Fernando Pessoa


Boiam leves, desatentos

Meus pensamentos de mágoa

Como no sono dos ventos

As algas, cabelos lentos

Do corpo morto das águas.


Boiam como folhas mortas

A tona de águas paradas

São coisas vestindo nadas

Pós remoinhando nas portas

Das casas abandonadas.


Sono de ser, sem remédio

Vestigio do que não foi

Leve mágoa, breve tédio,

Não sei se para, se flui

Não sei se existe ou se dói.

Olavo Bilac


"Ora (direis) ouvir estrelas! Certo

Perdeste o senso!" E eu vos direi, no entanto,

Que, para ouvi-las, muita vez desperto

E abro as janelas, pálido de espanto ...

E conversamos toda a noite, enquanto

A via láctea, como um pálio aberto,cintila.

E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,

Inda as procuro pelo céu deserto.


Direis agora: "Tresloucado amigo!

Que conversas com elas? Que sentido

Tem o que dizem, quando estão contigo?"


E eu vos direi: "Amai para entendê-las!

Pois só quem ama pode ter ouvido

Capaz de ouvir e de entender estrelas."

Salvador Dali


Tem mais samba - 1964

Tem mais samba no encontro que na espera
Tem mais samba a maldade que a ferida
Tem mais samba no porto que na vela
Tem mais samba o perdão que a despedida
Tem mais samba nas mãos do que nos olhos
Tem mais samba no chão do que na lua
Tem mais samba no homem que trabalha
Tem mais samba no som que vem da rua
Tem mais samba no peito de quem chora
Tem mais samba no pranto de quem vê
Que o bom samba não tem lugar nem hora
O coração de fora
Samba sem querer
Vem que passa
Teu sofrerSe todo mundo sambasse
Seria tão fácil viver

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Tem mais samba no encontro que na espera.


Mário Quintana

" Tão bom viver dia a dia
A vida assim, jamais cansa
Viver tão só de momentos
Como estas nuvens no céu

E só ganhar, toda a vida
Inexperiência... esperança
E a rosa louca dos ventos
Presa à copa do chapéu

Nunca dês um nome a um rio
Sempre é outro rio a passar
Nada jamais continua
Tudo vai recomeçar

E sem nenhuma lembrança
Das outras vezes perdidas
Atiro a rosa do sonho
Nas tuas mãos distraídas"

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Um dia ele chegou tão diferente do seu jeito de sempre chegar


Flor de Azeviche

Quando você pinta tinta nessa tela cinza
Quando você passa doce dessa fruta passa
Quando você entra mãe benta amor aos pedaços
Quando você chega nega fulô
Boneca de piche, flor de azeviche
Você me faz parecer menos só, menos sozinho
Você me faz parecer menos pó, menos pozinho
Quando você fala bala no meu velho oeste
Quando você dança lança flecha estilingue
Quando você olha molha meu olho que não crê
Quando você pousa mariposa morna lisa
O sangue encharca a camisa
Você me faz parecer menos só, menos sozinho
Você me faz parecer menos pó, menos pozinho
Quando você diz o que ninguém diz
Quando você quer o que ninguém quis
Quando você usa lousa pra que eu possa ser giz
Quando você arde ao arder e a sua teia cheia de ardiz
Quando você faz a minha carne triste quase feliz...
Você me faz parecer menos só, menos sozinho
Você me faz parecer menos pó, menos pozinho
Você me faz parecer menos... só
Menos sozinho...Você me faz parecer menos pó, menos pozinha

*Zeca Baleiro

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Luar, espere um pouco, que é pra o meu samba poder chegar


Ferreira Gullar

A história humana não se desenrola apenas nos campos de batalha e nos gabinetes presidenciais.
Ela se desenrola também nos quintais entre plantas e galinhas, nas ruas de subúrbios, nas casas de jogos, nos prostíbulos, nos colégios, nas usinas, nos namoros de esquinas.
Disso eu quis fazer a minha poesia.
Dessa matéria humilde e humilhada, dessa vida obscura e injustiçada, porque o canto não pode ser uma traição à vida, e só é justo cantar se o nosso canto arrasta as pessoas e coisas que não têm voz.

Vinícius de Morais

Uma mulher tem que ter qualquer coisa além da beleza
Qualquer coisa de triste, qualquer coisa que chora
Qualquer coisa que sente saudade
Um molejo de amor machucado
Uma beleza que vem da tristeza de se saber mulher
Feita apenas para amar, para sofrer pelo seu amor
E para ser só perdão.

Florbella Espanca

Toda esta noite o rouxinol chorou
Gemeu, rezou, gritou perdidamente!
Alma de rouxinol, alma da gente
Tu és, talvez, alguém que se finou!

Tu és, talvez, um sonho que passou
Que se fundiu na Dor, suavemente…
Talvez sejas a alma, a alma doente
D’alguém que quis amar e nunca amou!

Toda a noite choraste… e eu chorei
Talvez porque, ao ouvir-te, adivinhei
Que ninguém é mais triste do que nós!

Contaste tanta coisa à noite calma
Que eu pensei que tu eras a minh’alma
Que chorasse perdida em tua voz!…

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008


Pablo Neruda

Amor, quantos caminhos até chegar a um beijo
Que solidão errante até tua companhia!
Seguem os trens sozinhos rodando com a chuva.
Em tal não amanhece ainda a primavera.
Mas tu e eu, amor meu, estamos juntos,
Juntos desde a roupa às raízes, juntos de outono,
De água, de quadris, até ser só tu, só eu juntos.
Pensar que custou tantas pedras que leva o rio,
A desembocadura da água de Boroa,
Pensar que separados por trens e nações
Tu e eu tínhamos que simplesmente amar-nos
Com todos confundidos, com homens e mulheres,
Com a terra que implanta e educa cravos.

domingo, 30 de novembro de 2008


Assum Preto

Tudo em vorta é só beleza
Sol de Abril e a mata em frô
Mas Assum Preto, cego dos óio
Num vendo a luz, ai, canta de dor
Tarvez por ignorança
Ou mardade das pió
Furaro os óio do Assum Preto
Pra ele assim, ai, cantá de mió
Assum Preto veve sorto
Mas num pode avuá
Mil vez a sina de uma gaiola
Desde que o céu, ai, pudesse oiá
Assum Preto, o meu cantar
É tão triste como o teu
Também roubaro o meu amor
Que era a luz, ai, dos óios meus
Também roubaro o meu amor
Que era a luz, ai, dos óios meus.

Luiz Gonzaga

O carteiro e o poeta


"Diz sim e de novo não "

Aqui na ilha há tanto mar
O mar e mais o mar
Ele transborda de tempo em tempo
Diz que sim, depois que não
Diz sim e de novo não
No azul, na espuma, em galope
Ele diz não e novamente sim
Não fica tranqüilo, não consegue parar
Meu nome é mar ele repete
Batendo numa pedra, mas sem convencê-la
Depois com as sete línguas verdes
De sete tigres verdes, de sete cães verdes
De sete mares verdes
Ele a acaricia, a beija e a umedece
E escorre em seu peito
Repetindo seu próprio nome

*Pablo Neruda

O coração , se pudesse pensar , pararia.

"Considero a vida uma estalagem onde tenho que me demorar até que chegue a diligência do abismo.
Não sei onde me levará, porque não sei nada.
Poderia considerar esta estalagem uma prisão, porque estou compelido a aguardar nela
Poderia considerá-la um lugar de sociáveis, porque aqui me encontro com outros
Não sou, porém, nem impaciente nem comum
Deixo ao que são os que se fecham no quarto, deitados moles na cama onde esperam sem sono Deixo ao que fazem os que conversam nas salas, de onde as músicas e as vozes chegam cómodas até mim.
Sento-me à porta e embebo meus olhos e ouvidos nas cores e nos sons da paisagem, e canto lento, para mim só, vagos cantos que componho enquanto espero."

-Livro do Desassossego

* Fernando Pessoa

Greenpeace

"Quando a última árvore tiver caído

O último rio estiver secando

E o último peixe for pescado,

Vocês vão ver que dinheiro não se come."

Soneto

Por que me descobriste no abandono
Com que tortura me arrancaste um beijo
Por que me incendiaste de desejo
Quando eu estava bem, morta de sono

Com que mentira abriste meu segredo
De que romance antigo me roubaste
Com que raio de luz me iluminaste
Quando eu estava bem, morta de medo

Por que não me deixaste adormecida
E me indicaste o mar com que navio
E me deixaste só, com que saída

Por que desceste ao meu porão sombrio
Com que direito me ensinaste a vida
Quando eu estava bem, morta de frio

*Chico Buarque

EU TE AMO

Ah, se já perdemos a noção da hora
Se juntos já jogamos tudo fora
Me conta agora como hei de partir
Se, ao te conhecer, dei pra sonhar, fiz tantosdesvarios
Rompi com o mundo, queimei meus navios
Me diz pra onde é que inda posso ir
Se nós, nas travessuras das noites eternas
Já confundimos tanto as nossas pernas
Diz com que pernas eu devo seguir
Se entornaste a nossa sorte pelo chão
Se na bagunça do teu coração
Meu sangue errou de veia e se perdeu
Como, se na desordem do armário embutido
Meu paletó enlaça o teu vestido
E o meu sapato inda pisa no teu
Como, se nos amamos feito dois pagãos
Teus seios inda estão nas minhas mãos
Me explica com que cara eu vou sair
Não, acho que estás só fazendo de conta
Te dei meus olhos pra tomares conta
Agora conta como hei de partir

*Chico Buarque

Murmurio

Traze-me um pouco das sombras serenas
Que as nuvens transportam por cima do dia!
Um pouco de sombra, apenas
- vê que nem te peço alegria.

Traze-me um pouco da alvura dos luares
Que a noite sustenta no teu coração!
A alvura, apenas, dos ares
- vê que nem te peço ilusão.

Traze-me um pouco da tua lembrança
Aroma perdido, saudade da flor!
- Vê que nem te digo - esperança!
- Vê que nem sequer sonho - amor!

*Cecília Meireless

Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje
Assim calmo, assim triste, assim magro
Nem estes olhos tão vazios,nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força
Tão paradas e frias e mortas
Eu não tinha este coração que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança
Tão simples, tão certa, tão fácil
- Em que espelho ficou perdida a minha face?

*Cecília Meireles

Lágrimas ocultas

Se me ponho a cismar em outras eras
Em que ri e cantei, em que era querida
Parece-me que foi noutras esferas
Parece-me que foi numa outra vida.

E a minha triste boca dolorida
Que dantes tinha o rir das primaveras
Esbate as linhas graves e severas
E cai num abandono de esquecida!

E fico, pensativa, olhando o vago...
Toma a brandura plácida dum lago
O meu rosto de monja de marfim

E as lágrimas que choro, branca e calma
Ninguém as vê brotar dentro da alma!
Ninguém as vê cair dentro de mim!

*Florbela Espanca

sábado, 29 de novembro de 2008

Amor I love you

Deixa eu dizer que te amo
Deixa eu pensar em você
Isso me acalma me acolhe a alma
Isso me ajuda a viver
Hoje contei pra as paredes
Coisas do meu coração
Passeei no tempo
Caminhei nas horas
Mais do que passo a paixão
É um espelho sem razão
Quer amor fique aqui
Meu peito agora dispara
Vivo em constante alegria
É o amor quem está aqui
Amor I love you
Amor I love you

Quem é voce

Quem será que me chega na toca da noite.
Vem nos braços de um sonho que eu não desvendei.
Eu conheço o teu beijo, mas não vejo teu rosto.
Quem será que eu amo e ainda não encontrei...
Que sorriso aberto
Um olhar tão profundo
Que disfarce será que usa pro resto do mundo
Onde será que você mora, em que língua me chama
Em que cena da vida haverá de comigo cruzar
Que saudade é essa do amor que eu não tive
Porque é que te sinto se nunca te vi
Será que são lembranças de num tempo esquecido
Ou serão previsões de te ver por aqui
Então vem
Me desvenda esse amor que me faz renascer
Faz do sonho algo lindo
Que me faça viver
E se fiz com os céus algum trato
Esclarece esse fato que me faz compreender
Desse beijo esse abraço na imaginação
E descobre o que guardo pra ti em meu coração
Mas deixe eu sonhar, deixa eu te ver
Vem e me diz quem é você
Mas deixa eu sonhar, deixa te ver
Vem e me diz quem é você
"Havia, em algum lugar, um parque cheio de pinheiros e tílias, e uma velha casa que eu amava.

Pouco importava que ela estivesse distante ou próxima,que não pudesse cercar de calor o meu corpo,nem me abrigar.

Reduzida apenas a um sonho,bastava que ela existisse para que a minha noite fosse cheia de sua presença.

Eu não era mais um corpo perdido no areal.

Eu me orientava. Era a menina daquela casa, cheia da lembrança de seus perfumes,cheia da fragrância dos seus vestíbulos,cheia das vozes que a haviam animado."

*Antoine de Saint-Exupéry